Sim. É por aí que vamos começar nossa conversa de hoje. E é exatamente como está escrito: se o seu consumo de frutas, legumes, verduras, peixes, óleos naturais, for insuficiente de micronutrientes essenciais acarretando uma alimentação desequilibrada, você é um grande candidato para ter Fome Oculta; mesmo que a sua alimentação esteja adequada em calorias. É uma síndrome que está ligada à qualidade nutricional e não a quantidade ingerida.
Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, 2013) a Fome Oculta afeta 1 a cada 3 pessoas. Isso quer dizer que, você que está agora lendo essa matéria e acabou de conversar com 2 pessoas no WhatsApp, uma de vocês três tem probabilidade de ter Fome Oculta.
Por muitos e muitos anos a preocupação mundial, a agenda política e de desenvolvimento global, foi com a Fome Crônica. É a fome causada pela deficiência de calorias, que é um tipo de desnutrição. Ainda há muitas pessoas no mundo que sofrem de Fome Crônica, ou seja, que passam fome e são desnutridas por estarem na miséria. E essa ainda é uma das mais doloridas preocupações de toda a humanidade. E de alguns anos para cá também tem crescido consideravelmente o risco de Fome Oculta.
Existem diferentes conceitos de fome. A fome geralmente é entendida como angústia associada à falta de comida. A FAO define fome como privação alimentar. Assim, desnutrição vai além das calorias e significa privação de: energia e/ou proteína e/ou vitaminas e minerais essenciais. A privação alimentar pode ocorrer também na supernutrição. Vou explicar: quando há o consumo de muitas calorias, mas com baixa ingestão de alimentos ricos em micronutrientes, ou seja, come-se em grande quantidade e ao mesmo tempo tem privação alimentar de vitaminas e minerais essenciais. E, por vezes, pessoa tem uma sensação de fome, mesmo estando saciada caloricamente. Fica a questão: o seu corpo tem fome do que?
A Fome Oculta, então, é um tipo de desnutrição que ocorre quando a ingestão de micronutrientes essenciais (vitaminas e minerais) é baixa para sustentar a saúde. Essa deficiência pode ser de leve, afetando o bem-estar, causando fadiga; moderada, comprometendo o desenvolvimento de uma criança; grave, causando comprometimento mental, do sistema imunológico, baixa produtividade; e em casos severos pode causar até a morte. É bem comum, por exemplo, uma pessoa obesa ter esse tipo de desnutrição.
Quem são os candidatos para Fome Oculta? São as mesmas pessoas que tem risco de ter Fome Crônica por não terem condição financeira e não terem acesso fácil a alimentos e nem orientações nutricionais, mas também acomete pessoas que tem dinheiro para comprar o que quiserem, como: pessoas que tem uma rotina estressante e não tem tempo para se alimentar de forma equilibrada; pessoas que aderem aos modismos alimentares com dietas extremamente restritivas e sem acompanhamento profissional; pessoas que se alimentam de “junk food” e/ou “fast food”, ou seja, comida rica em caloria, baixa qualidade nutricional e alto teor de gorduras, sal ou açúcares (guloseima, hamburguer pronto acompanhado de batata frita e refrigerante, bolacha recheada, salgadinhos empacotados, chocolates); idosos que tem dificuldade de preparar suas refeições com alimentos naturais e optam por manter uma alimentação a base de pães, bolos, leite, biscoitos, sopa de batata com arroz e banana (sem variedade); pessoas com problemas de saúde, como: doenças infecciosas ou parasitárias (vermes).
Em linhas gerais, vou fazer algumas pontuações sobre qualidade nutricional e frequência de consumo. Alguns alimentos têm a composição nutricional desbalanceada, que são principalmente: os produtos processados e os ultra processados. Eles deveriam ter um consumo restrito na nossa rotina alimentar, uma eventualidade, pois não são “alimentos puros”, são produtos alimentícios feitos pela indústria.
Os processados devem ter o consumo LIMITADO: alimentos conversados em solução de sal e vinagre (ervilha, palmito, milho); frutas em calda (pêssego, abacaxi); frutas cristalizadas, qualquer produto que tem no rótulo alto teor de sal ou açúcar; enlatados; pães feitos com farinha, levedura, água e sal.
Os ultra processados devem ter o consumo EVITADO: biscoitos recheados, salgadinhos “de pacote”, refrigerantes, macarrão instantâneo, cereais açucarados, balas, guloseimas, bebida láctea adoçada, extratos de carne de frango ou peixe empanados do tipo nuggets, salsichas e outros embutidos, pães doces e produtos panificados cujos ingredientes incluem substâncias como gordura vegetal hidrogenada, açúcar, amido, soro de leite, emulsificantes e outros aditivos.
O que sobrou para nós sermos saudáveis e sem Fome Oculta? TODOS OS OUTROS ALIMENTOS: in natura ou minimamente processados e todas as preparações culinárias, ou seja, todos os alimentos que vem da natureza! São os alimentos que você compra no hortifruti, na feira, chega em casa e come in natura ou faz preparação culinária de sua preferência: comida de verdade! Ou vai até um restaurante que faz uma comida de verdade! Ou pede por telefone para entregar na sua casa de um lugar que faz uma comida de verdade!
Quais alimentos in natura ou minimamente processados? Legumes, verduras, frutas, batata, mandioca e outras raízes e tubérculos; arroz branco, integral ou parboilizado; milho, grão do trigo, feijão de todas as cores, lentilhas, grão de bico e outras leguminosas; cogumelos; frutas secas; castanhas, nozes, amendoim e outras oleaginosas sem sal ou açúcar; cravo, canela, especiarias em geral e ervas frescas ou secas; carnes de gado, de porco e de aves e pescados frescos, resfriados ou congelados; leite pasteurizado; ovos; chá, café, e água potável. Ou seja, são a base para uma alimentação nutricionalmente balanceado e saborosa.
Quero fazer uma proposta para você, posso? É a seguinte: dentro das condições financeiras que você tem, organize-se para ter como prioridade comprar alimentos que a natureza produz! E para sempre lembrar dessa nossa conversa, quero também propor para você ter um LEMA: “descascar mais, desembrulhar menos”! Topa?
Espero que essa matéria faça você repensar a sua rotina e escolhas alimentares. Tenha sempre como referência, quando precisar se informar, um profissional da área da saúde. E deixei para você uma recomendação de leitura: Guia Alimentar para a População Brasileira (está liberado aqui na página o arquivo em pdf).
Guia alimentar para a população brasileira / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014.
Angelis, Rebeca Carlota de. Fome Oculta: impacto para a população do Brasil. São Paulo: Editora Atheneu, 1999.
Thompson, Jennifer e Sonntag, Andrea. Global Hunger Index: The Challenge of Hidden Hunger. Bonn / Washington, D.C. / Dublin. October, 2014.
Muito interessante esse texto, principalmente nesse momento de quarentena., pois como estamos ficando mais tenpo em casa podemos optar e preparar refeições mais saudáveis. Na correria do dia a dia, muitas vezes comemos de forma inadequada por falta de tempo. Parabéns Alessandra Rischiteli?????
Obrigado pelo contato, Alessandra!